quarta-feira, 31 de março de 2010

Continuando...

Mais uma declaração, dada a conhecer naquela altura das "eleições de 1969", em Outubro.

Refere-se aí, de entre o mais, as promessas de Marcelo Caetano de abertura do regime, que nunca foram cumpridas.


SEGUNDA DECLARAÇÃO


Se for eleito...


Além da reforma constitucional que já apresentei na minha primeira declaração e que representa o primeiro passo jurídico a dar no sentido reformista, das institui­ções, venho agora enunciar os princípios de ordem política que me proponho defender.
Estou certo de que enquanto não for consentida, a constituição de três ou quatro partidos políticos que cor­porizem as grandes e dominantes correntes da opinião pública—tudo será ilusório, artificial, precário, desti­tuído de bases efectivas e perduráveis.
Sou, sem qualquer dúvida, adepto de todas as tenta­tivas para a união das forças democráticas nacionais mas com a indispensável condição de que ela conduza ao cabo dessa empresa aglutinadora, a uma independência ideo­lógica, a uma sistematização de meios, de objectivos, de fórmulas e de princípios.
O que afirmo categoricamente é que não penso aco-modaticiamente por qualquer cabeça nem sinto desapaixonadamente por qualquer coração e, mesmo dentro dos meus mais estimados e autorizados amigos e correligio­nários, tenho naturalmente as minhas variantes, e por­ventura as minhas discordâncias.
Sou por isso, aberta e decididamente contra o monolitismo da União Nacional — instrumento incondicional de todos os actos do Governo, de onde promanou a própria nomeação dos seus agentes e elementos directivos, visto que ela fecha as portas àqueles que não se colocarem submissamente sob a sua alçada. A sua estrutura de Par­tido Único repugna-me ainda que alguns dos seus postu­lados — no tocante à independência da Pátria, à unidade da família, à perseverança da ordem, da disciplina e da paz, ao progresso social e ao fomento económico e agrí­cola — possam merecer a minha aprovação.
Os caminhos que levam a esses supremos desígnios não são, porém, aqueles que a União Nacional autoritária e arbitrariamente aponta como exclusivos; há outro recei­tuário; há outras vias e estas têm de ser completamente discutidas, analisadas, confrontadas, batidas de sol — e isso só é possível, só será possível fazê-lo, em pleno regime democrático, sem contrafacções nem desvios.
Ora, um regime democrático — eis um dogma para a minha inteligência — pressupõe o funcionamento de par­tidos, e, portanto, enquanto eles não forem autorizados, sempre cairemos no vácuo ou na ditadura.
Por isto mesmo é que o País está despolitizado e que as forças díspares da Oposição — e até da união Nacional —aproveitam todas as ocasiões propícias e consentidas pelo Governo, para estabelecerem, ou melhor, improvisa­rem uma vigorosa coligação contra o existente, surgindo até em vários sectores, o que vem confirmar o que acaba­mos de expor.
É, pois, evidente que o Governo, que não devia ali­mentar ilusões a tal respeito, se desejasse eleições verda­deiramente representativas teria de ter instaurado pri­meiro a Democracia, nos moldes atrás propostos e então veria que os bons patriotas surgiam de todos os lados, devida e ordeiramente agrupados, cada um trazendo a sua mensagem para a nobre tarefa comum de redimir e engran­decer Portugal.
Por assim não ter acontecido verificou-se o inevitá­vel. — O apelo do Sr. Presidente do Conselho lançado em 27 de Setembro passado ficou lamentavelmente sem res­posta; mais; a resposta foi negativa, conforme a presente campanha eleitoral o demonstra indesmentivelmente.
Está esgotado o livro de cheques em branco que nos foi pedido e esperançosamente lhe confiamos e podemos até dizer que o último cheque usado em 11 de Setembro findo não tinha cobertura...
A presente consulta eleitoral para a Assembleia Nacio­nal parece-nos assim uma concessão sem efeitos práticos, uma vez que não pode ela traduzir, mesmo nas graduações regionais a que está submetida, as verdadeiras tendências dos eleitores.
Efectivamente, os candidatos da União Nacional representam obviamente o Governo, São em geral, seus serventuários.
E como está a manifestar-se a restante e diversifi­cada opinião do país? Através de quem? De deputados auto-classificados de independentes ou com classificações mal definidas?
Por muito dotados que sejam — no político, no inte­lectual, no social, no moral — que legítima representação se lhes poderá atribuir.
Sem qualquer dúvida; a de si próprios, o que julga­mos absolutamente insuficiente.
Quer dizer, o Governo impõe à Oposição os seus pró­prios vícios e defeitos políticos, pois conduz-nos para o abominável culto da personalidade.
Não defendemos uma multiplicação, uma pulveriza­ção partidária, falsa e nociva (para a evitar há muitos remédios eficazes) mas entendemos que a República é por essência Democracia e Democracia implica organização de Partidos.
Fora de uma genuína representação partidária que corresponda evolutivamente aos profundos anseios e às profundas mutações da natureza humana —, tudo redun­dará em pura dialéctica e em pura sanção de uns tantos sobre uns tantos.
De muitos ou de quase todos—NUNCA—.
Todavia e apesar de tudo, aceitei no campo legal— aliás de uma legalidade precária imposta pela facção gover­namental — a luta que nos é oferecida, pela razão sim­ples de que nós os da Oposição continuamos a querer mos­trar que existimos, que não estamos demitidos de nós próprios, já que em Portugal viver-se politicamente só pode ser: ou na União Nacional ou na Clandestinidade.
Ora, eu não aceito nem uma nem outra destas opções. Sou um homem livre que quer viver numa Pátria Livre.
É este o meu legítimo anseio e decerto o anseio de todos os eleitores do Distrito de Braga.

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